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Esta é a história de como se vive na barriga de uma baleia.
Esta é a continuação da história de como se vive na barriga da baleia:
"E achando-me em dias tão difíceis decidi alimentar
a baleia que então me dava guarida:
tive jornadas que excediam em muito as doze horas
e meus sonhos foram ofícios rigorosos, meu cansaço
engordava como o ventre da baleia:
que trabalheira caçar os animais mais robustos,
despojá-los de todas as suas escamas e uma vez abertos
arrancar-lhes o fel e o espinhaço,
e minha casa engordava.
(Foi a última vez em que fui duro: insultei a baleia,
recolhi meus escassos pertences para buscar
algum abrigo em outras águas, e já me preparava
para construir um periscópio
quando no teto vi incharem como dois sóis seus pulmões
– iguais aos nossos
mas estirados sobre o horizonte –, suas omoplatas
remavam contra todos os ventos,
e eu sozinho,
com minha camisa azul-marinho em um grande prado
onde podiam alvejar-me de qualquer janela: eu, o coelho,
e os cães velozes atrás, e nenhum buraco.)
E achando-me em dias tão difíceis
acomodei-me entre as zonas mais moles e mau cheirosas da baleia."
(Antonio Cisneros, "Apêndice do poema sobre Jonas e os desalienados", no Canto cerimonial contra um tamanduá, 1968. A tradução é de Carlito Azevedo e Aníbal Cristobo)
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